junho 22, 2006

O projeto perdido, por Paulo Rabello de Castro, Folha de São Paulo de 21-06-06

PAULO RABELLO DE CASTRO - "O projeto perdido"
De fato, Brasil perdeu o gosto pelo sucesso do crescimento, tornou-se um país de triste estabilidade
O TIME de Lula, ao chegar ao poder, não tinha política econômica de crescimento para oferecer ao país. Aliás, ganhou a eleição pela mera esperança dos seus eleitores -vencendo o medo- de ver aplicado um programa de mudanças efetivas, mas sem os contornos da política defendida pelo PT em suas convenções anteriores. A "Carta ao Povo Brasileiro" representou uma espécie de contrato social de última hora, bem bolado pelos príncipes do partido para os barões do mercado. Deu certo. O extraordinário crescimento mundial nos três anos que se seguiram, e ainda neste, sem nenhuma crise de ajustamento externo, associado à chamada "âncora verde" da produção agrícola embalada pelo dólar alto até 2004, propiciou elementos essenciais ao sucesso da estabilização com alta de salário mínimo (embora quase nenhum do salário médio!) alcançado na era Lula. A fórmula da canja de galinha do ministro Palocci também deu certo no plano fiscal: arrocho crescente pelo lado da tributação e início de uma série de medidas de avanço nas reformas chamadas de "microeconômicas", como se convencionou apelidar a "agenda perdida" preparada por liberais da FGV. O belo esforço neoliberal de Palocci foi pavimentado pelo juro mais alto do mundo, atraindo os capitais de curto prazo, dando alegria aos investidores financeiros e fazendo a festa dos mercados de capitais. O agronegócio bancou a conta. O projeto de crescimento econômico do governo Lula, se houve algum, ao menos no discurso, perdeu-se de vez no calendário das atas do Copom. Um projeto perdido, que não fez a mínima falta a um país embalado a sonhos de futebol (que nem isso tem para encher os olhos cansados do torcedor...). O crescimento econômico -como paradigma de avaliação de desempenho dos governos- há muito não consta na lista de exigências do eleitor brasileiro, já acostumado à semi-estagnação do mercado nacional. Por que ocorre a posição conformista do eleitor? Situação semelhante foi vivenciada, pela última vez, no período de 95 a 98, primeiro mandato de FHC, que lhe garantiu a vitória na reeleição, em 1º turno. Tanto então quanto agora o salário paulista vale mais em termos de moedas estrangeiras. O brasileiro quer passear no exterior, e o poder de compra cresceu formidavelmente. Porém esse ganho não é sustentável. Implicará novo ajuste, porque a indústria não tem conseguido competitividade adequada para seus produtos nessa faixa cambial. Outros países, especialmente em períodos autoritários (por exemplo, a Argentina de Martinez de Hoz) ou quando usufruindo demanda excepcional por um produto predominante nas suas exportações (como o cobre no Chile, atualmente), acabam tendo uma valorização cambial desalinhada a suas necessidades de crescimento a longo prazo. A Argentina do general Videla, ao final dos anos 70, contratou dólares de empréstimo para sustentar o câmbio artificialmente valorizado, "moendo" a indústria local e provocando o desequilíbrio macroeconômico daquele país nos anos 80. No Brasil, temos usado o expediente da valorização cambial, às expensas do crescimento do setor produtivo. É a política oposta à dos concorrentes asiáticos, de modo geral, e da China, especialmente, mas também do Japão, durante longo período do pós-guerra. A política desses países, de desvalorização controlada da moeda local, conjugada à acumulação de reservas e baixa propensão ao gasto público, rendeu-lhes crescimento acelerado por longos anos. A Argentina de Néstor Kirchner resolveu contrariar a tradição de Videla e Martinez de Hoz. Mantendo o câmbio mais desvalorizado, adotando uma política que atrapalha um pouco o controle inflacionário, mas lhe dá amplo ganho em crescimento econômico, já conseguiu colocar uma cabeça e meia à frente do Brasil em sua recuperação após a tragédia do câmbio unitário com o dólar. Em quatro anos, o PIB argentino cresceu quase o triplo da média brasileira: em 2003-2006 (estimada) de 2,85% para o Brasil e de 8,75% para a Argentina. Na visão retrospectiva de 1990 para cá, com todos os seus trágicos erros, a economia da Argentina iguala-se à do Brasil, que teria tanto mais potencial. De fato, o Brasil perdeu o gosto pelo sucesso do crescimento. Tornou-se um país de triste estabilidade.
PAULO RABELLO DE CASTRO , 57, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas, a cada 15 dias, nesta coluna.
rabellodecastro@uol.com.br

junho 20, 2006

Balaio de gatos, por Xico Graziano, em O Estado de S. Paulo de 20-06-06

O processo da reforma agrária brasileira virou uma rosca sem fim: quanto mais assentamentos se realizam, piora a confusão fundiária. Haverá final nessa encrenca?

Os malucos do MLST depredaram a Câmara dos Deputados solicitando acelerar a reforma agrária. Inadmissível o vandalismo. Fica, porém, a dúvida de que tarda a justiça no campo. O governo, repetindo a cantilena petista contra Fernando Henrique, enrola os movimentos sociais.
Lula assumiu e a questão piorou. Não cessam as invasões, cresce a violência. O presidente da República afaga a turma, bota boné na cabeça, libera verbas suspeitas, mas, como que experimentando do próprio veneno, não se livra da crítica feroz.

Noves fora a política, os números desmentem, cabalmente, os céticos. Até o final do ano estarão assentadas em projetos de reforma agrária, desde a redemocratização do País, cerca de 900 mil famílias. Descontando a maquiagem oficial. Para comparação, existem em São Paulo 250 mil agricultores.
Foram distribuídos cerca de 40 milhões de hectares. Uma vastidão. Basta saber que a área cultivada com grãos no Brasil deverá atingir 45 milhões de hectares na próxima safra. A somatória das plantações de cana-de-açúcar, café e cacau mal atinge 10 milhões de hectares.

Afirmar que o Brasil não faz reforma agrária é um bordão mentiroso. Serve ao proselitismo, não ao conhecimento objetivo. Nenhuma nação realizou, pela via democrática, tamanha distribuição fundiária. O problema da reforma agrária brasileira, com certeza, não é de quantidade, mas, sim, de qualidade.
Qualquer governo que se pautasse pelo planejamento racional preferiria consolidar os assentamentos existentes, verdadeiras favelas rurais, a avançar nas desapropriações. Sendo correto, como, então, resolver o drama dos acampados?
A resposta é decepcionante: basta selecioná-los para descobrir que, na grande maioria, se constituem de falsos sem-terra. A solução para eles está no emprego, não na terra. Gente desocupada, trabalhadores urbanos desiludidos, excluídos sociais misturados com oportunistas: assim se recrutam os invasores de terras.
Os alojamentos à beira das estradas representam, afora as exceções, uma farsa. Simplesmente não é verdade que exista 1 milhão de pessoas acampadas. Quem conhece esse jogo da miséria humana sabe que as listas têm mais gente que os barracos. Primeiro, prometem cestas básicas, depois, quem sabe, a terrinha boa. Chove inscrição.
Na década de 1960, estudos patrocinados pela FAO sobre a pobreza dos camponeses latino-americanos sugeriam a reforma agrária para promover o seu desenvolvimento. No caso brasileiro, estimavam-se em 12 milhões de famílias os beneficiários da política fundiária. Pouco se fez.
Com a modernização agrícola e a industrialização, o terrível êxodo rural impôs sua lógica. Milhões de famílias migraram para as cidades entre os anos 60 e 80, principalmente. Surgiram os bóias-frias, assalariados sazonais. Mudou o mundo do trabalho no campo.
Em 1985, já terminada a ditadura militar, o governo Sarney patrocinou a elaboração de um plano fundiário. Seus idealizadores calcularam que havia entre 6 milhões e 7 milhões de "beneficiários potenciais" da reforma agrária. Quem eram?
Uma miscelânea de gente. Para começar, somavam os 2 milhões de pequenos agricultores, chamados minifundiários, com seus agregados. Depois, agregavam os parceiros, os arrendatários e os posseiros, num total de 1,5 milhão de produtores "precários". Por fim, adicionavam dois terços dos assalariados rurais do País. Esse balaio de gatos, ajuntando categorias rurais diferentes, produziu uma excrescência teórica.
Ora, os pequenos agricultores, embora pobres e de subsistência, são trabalhadores "com terra". A solução para o seu drama depende do acesso à tecnologia e a mercados favoráveis. Arrendatários nem sempre desejam ser donos do solo que exploram; posseiros preferem assegurar, juridicamente, seu lote. As demandas são heterogêneas, cada qual alimenta um sonho.
Quanto aos assalariados rurais, certamente podem ser considerados sem-terra, pois vivem da força de trabalho. Imaginar que devessem ser produtores autônomos significa voltar à Idade Média. Afinal, inexiste capitalismo sem assalariados.
Suponhamos, porém, que tal proposta fosse adiante. Com o avanço da eventual reforma, a subtração de mão-de-obra enxugaria a oferta de trabalho, elevando os salários. Logo se tornaria mais atraente permanecer assalariado, com carteira assinada, direitos reconhecidos, que aventurar-se na lide da produção rural. Afinal, não é errado, nem feio, ser operário. Nem na cidade nem no campo.
O site do MST afirma existirem 4,8 milhões de sem-terra. Ninguém sabe direito como isso foi calculado. Representa quase o triplo dos assalariados temporários rurais no País. E, ao contrário do desemprego, há falta de mão-de-obra no campo para certas atividades, principalmente para a colheita. Certo ou errado, pouca gente quer hoje trabalhar na roça. Morar, então, nem pensar.
Conclusão: é impossível calcular a quantidade de pessoas que deveriam ser assentadas no campo. Quer dizer, é indefinido o número de sem-terra existente no País. Qualquer estimativa será chutada. E pode conter você!
Por incrível que pareça, no teatro do absurdo em que se transformou a questão agrária brasileira, os verdadeiros sem-terra representam a minoria. Pior. Servem de massa de manobra, pobres coitados, para os revolucionários de araque.

junho 19, 2006

Mais democracia, por Ilimar Franco, em O Globo de hoje

A democracia representativa está em crise no mundo. Nos países onde o voto é facultativo a abstenção é de 50%. No Brasil, o escândalo do mensalão abalou a credibilidade do sistema partidário. Na América do Sul partidos tradicionais sucumbem diante de líderes populares carismáticos. Cada vez mais as ONGs, cujo financiamento não é transparente, participam das decisões políticas.
Essa realidade pôs a reforma política na agenda dos partidos e líderes políticos. A proposta de reforma em discussão no país prevê a redução do número de partidos, o financiamento público das campanhas, o voto em listas partidárias e a fidelidade. Mas isso não resolve o problema da legitimidade e da governabilidade.
Isso ocorre, avalia o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), porque a democracia representativa sozinha não se agüenta mais nas pernas e precisa ser oxigenada pelo exercício da democracia direta. Para Gabeira, é preciso articular o trabalho do Parlamento com decisões populares, através de referendos e plebiscitos. Esta também é a posição do ministro de Relações Institucionais, Tarso Genro, que em seu livro “A Esquerda em progresso”, defende a exacerbação da consulta aos eleitores, do referendo e do plebiscito.
O jurista Fábio Comparato também aposta nessa via. Argumenta que a participação popular é indispensável nas democracias modernas e que isso significa eleger os governantes e também decidir diretamente as grandes questões do país. A OAB apresentou à Câmara um projeto que facilita a realização de plebiscitos, referendos e o uso da iniciativa popular legislativa.
— A democracia direta vai revitalizar e fortalecer a democracia representativa — diz Gabeira.
Nos EUA, 1.989 consultas no século XX
Mas o uso desses instrumentos não estão na pauta dos reformadores políticos. Os caciques e os partidos resistem a transferir o poder para os próprios eleitores. Há resistências dos que temem o veredito popular e daqueles que, passadas quatro décadas, repetem a fatídica frase de que o povo não sabe votar.
O exercício da democracia direta é uma prática recorrente na maior democracia mundial, os Estados Unidos. Entre 1904 e 2000 foram realizadas 1.989 consultas aos eleitores em 25 estados americanos. No ano passado foram 45 consultas em 12 estados, entre os quais a Califórnia, o Texas e Nova Iorque.
A realização de referendos e plebiscitos, destaca Gabeira, é a forma das maiorias se manifestarem, como ocorreu na questão do desarmamento em 2005 e na do sistema de governo em 1993. O posicionamento dos eleitores é ainda mais necessário num processo político em que os candidatos não se posicionam sobre todos os temas, no qual o discurso dos candidatos é definido por pesquisas de opinião pública e os políticos tergiversam sobre temas polêmicos, que podem lhes custar votos de setores da sociedade.
A participação dos eleitores nas decisões poderia destravar questões que estão interditadas pelos limites da correlação de forças partidárias no Congresso. Será que os governos brasileiros fariam ajustes fiscais à custa do aumento da carga tributária, se a população fosse consultada? Será que o Congresso continuaria se vergando à corporação dos funcionários públicos, mantendo suas aposentadorias, se os eleitores pudessem se manifestar?

junho 15, 2006

CRESCIMENTO SUSTENTADO: SEM HORIZONTE?

ARTIGO (Folha de S.Paulo de 15-06-06)
Crescimento sustentado: sem horizonte?
Nossos maiores problemas são o "custo Brasil", o custo do trabalho, a elevada carga tributária e a nossa dificuldade em fechar acordos comerciais favoráveisMARIA CRISTINA MENDONÇA DE BARROSTEREZA MARIA FERNANDEZ DIAS DA SILVA O DESEMPENHO positivo da economia mundial vem surpreendendo a maioria dos analistas. As revisões de crescimento, quando acontecem, dão-se para cima. Os Estados Unidos acabaram de divulgar o resultado do PIB (Produto Interno Bruto) do primeiro trimestre, apontando para o crescimento próximo de 5% ao ano. A maioria dos países asiáticos cresce fortemente, liderados pela economia chinesa, que deve superar mais uma vez os 10% ao ano. Na América Latina, o crescimento esperado para 2006 é da ordem de 4,3%. O Brasil é um dos países de menor crescimento esperado, de 3,5% no ano, confirmando a tendência recente de crescermos abaixo da média mundial. Por que isso? Muito se tem falado sobre a superação de nossa restrição externa ao crescimento, pelo desempenho da balança comercial e pela importante diminuição do nosso endividamento. De fato, a dependência brasileira de financiamento internacional diminuiu expressivamente, permitindo a valorização de "rating" e a diminuição do "spread" de captação de papéis brasileiros -públicos e privados. No entanto todo esse avanço no setor externo brasileiro não tem sido suficiente para atrair investimentos que nos garantam o tão desejado crescimento sustentado. Na verdade, a melhoria do setor externo, somada à atração dos juros praticados domesticamente, teve como conseqüência uma mudança no valor relativo do nosso câmbio que tem provocado alterações importantes na gestão da maioria das empresas e afetado as decisões de investimento. Dito de outra forma: além de mudar, por si só, as condições de competitividade da nossa economia, a valorização do real desnuda os problemas estruturais que impedem o crescimento sustentado e que, somados à competição chinesa, obriga nossas indústrias a um ajuste profundo. Quais são esses problemas estruturais? São o chamado "custo Brasil", que começa nas nossas estradas e portos, passando pelo custo do trabalho e pela elevadíssima carga tributária e que são aprofundados pela nossa dificuldade em fechar acordos comerciais favoráveis. Todos esse fatores, associados à valorização da moeda, têm dificultado a vida de muitas indústrias e transformado a vida de outras tantas. Alguns setores foram afetados mais rapidamente e já sofrem as conseqüências da mudança no patamar do câmbio, a exemplo do agribusiness, um dos mais importantes da economia brasileira. Reconhecidamente uma das mais competitivas do mundo, a agropecuária brasileira está atravessando uma crise de liquidez e inadimplência decorrente da queda de rentabilidade. Não é sem motivo que a Bunge, uma das maiores empresas atuantes no complexo de soja no Brasil, suspendeu investimentos próximos a US$ 1 bilhão (cerca de R$ 2,28 bilhões) no país, além de estar diminuindo o tamanho da sua operação (foram fechadas nove fábricas). A ADM, sua concorrente, reduziu em 30% sua capacidade de processamento. Outros setores da economia estão buscando soluções diferentes. Algumas de nossas indústrias estão investindo fora do país, o que é positivo do ponto de vista da sua internacionalização, mas que, no curto prazo, traduz-se num desestímulo a mais para o crescimento doméstico. Essa lista não é pequena, e estamos vendo as notícias diariamente nos jornais. Na área têxtil, duas fusões importantes aconteceram: a Santista com a Tavex e a Coteminas com a Springs, ambas fundamentais para a sobrevivência dessas empresas, mas que estão levando para a América Central e para a Ásia os investimentos em novas unidades. A Motores WEG está ampliando sua atuação na China e no México. A Ford do Brasil está investindo em quatro novas unidades na Ásia e não tem nenhum plano de novos investimentos no Brasil. A Marco Polo já se prepara para investir na sua sexta subsidiária externa. Na área química, a Unigel acabou de anunciar a compra de uma fábrica no México para, por meio daquele país, participar de maneira mais ativa nos mercados americano e mexicano. Esses são alguns exemplos conhecidos de redirecionamento de investimentos. Outra parte da indústria está substituindo insumos e componentes nacionais por importações de intermediários, como alternativa para a manutenção da competitividade. O setor de autopeças tem utilizado as importações de maneira importante, diminuindo o grau de nacionalização dos nossos automóveis, o mesmo acontecendo com setores como o moveleiro, o calçadista e o de partes e peças de motores industriais, sem, contudo, ampliar de maneira importante a sua capacidade produtiva. O setor siderúrgico também está preocupado. As importações chinesas de produtos com aço contidos em carros, máquinas e equipamentos e autopeças poderá implicar, em futuro próximo, a redução da produção de aço brasileira. E, finalmente, as mais afetadas estão encerrando suas atividades industriais e passando a comercializar produtos de outros países -aconteceu recentemente com uma empresa do setor de acessórios para móveis, no Paraná. Enquanto comemoramos o resultado positivo do setor externo, que em parte tem respaldo no forte crescimento mundial e na elevada liquidez presente no mercado internacional -fatores não definitivos-, estamos mais uma vez perdendo a oportunidade de encaminhar uma solução de longo prazo. Estamos distantes de termos uma solução satisfatória para o problema fiscal que nos faz campeões mundiais de arrecadação, obriga-nos à manutenção de uma política monetária agressiva e afasta investimentos produtivos de porte. Não demos conta de solucionar os gargalos da infra-estrutura, que tiram competitividade de forma importante. Não avançamos na modernização da legislação trabalhista. E, finalmente, a política externa brasileira não tem conseguido resultados comerciais que permitam uma inserção mais competitiva no comércio internacional. O conjunto da obra diminui a atratividade relativa do Brasil no fluxo mundial de investimento. Por enquanto, vamos surfando na onda do crescimento mundial que tem elevado o preço das nossas commodities e possibilitado algum repasse de preço em bens manufaturados. Mas essa não é definitivamente a solução para os nossos problemas.
MARIA CRISTINA MENDONÇA DE BARROS e TEREZA MARIA FERNANDEZ DIAS DA SILVA são sócias da MB Associados

junho 13, 2006

IGUALDADE DE OPORTUNIDADES - CRISTOVAM BUARQUE

Folha de S.Paulo de 13/06/06

Igualdade de oportunidades, por CRISTOVAM BUARQUE

A IGUALDADE PLENA só é possível se imposta por regimes autoritários. Igualdade plena não rima com plena liberdade. A democracia não busca nem constrói a igualdade. Ela liberta o mérito como instrumento de ascensão social: o talento no lugar da herança. Não é um sistema de igualdade, mas de mérito. Mas a meritocracia não é necessariamente democrática, se for excludente e não oferecer oportunidades.
Só é democrática a sociedade que assegura a igualdade de oportunidades a todos os seus cidadãos, enriquecendo a sociedade ao incentivar o talento de cada indivíduo. O autoritarismo concentrador empobrece a sociedade, ao impedir o talento dos excluídos e não exigir talento dos protegidos. O autoritarismo igualitário impõe a igualdade independentemente do talento; ao desestimular o potencial de cada indivíduo, enfraquece o conjunto da sociedade.
O papel da democracia é garantir a igualdade de oportunidades e o respeito às diferenças que surgem do uso individualizado do talento e da persistência. O talento do atleta que se dedica por anos ao desenvolvimento de seu físico e sua técnica; do profissional liberal que persiste por anos em seus estudos e em sua profissão; dos artistas que insistem nos repetitivos ensaios de seus dons. A universidade brasileira é um caso claro de meritocracia excludente, que seleciona as pessoas conforme sua renda. Seu aluno é escolhido pelo mérito que lhe assegura passar no vestibular, com talento e persistência nos estudos, mas também graças ao privilégio da distribuição desigual de oportunidades, que evita a concorrência com o talento de milhões de excluídos, sem direito a uma escola básica de qualidade.
Se todos os jovens brasileiros tivessem estudado em boas escolas, com as mesmas oportunidades, muitos dos que passaram no vestibular teriam sido desclassificados, perdendo a proteção de escolas especiais desde a infância. É como se houvesse dois caminhos definidos pela renda: um deles leva à universidade, outro não.

Aqueles que têm o privilégio de acessar o caminho da universidade, no final têm que saltar o muro do vestibular, e disputar com companheiros de estrada, usando o próprio talento.Mas os que são empurrados para o outro caminho ficam impedidos de desenvolver seus talentos e de disputar o vestibular, e vão cair na vala comum dos deseducados.
A democracia das oportunidades desiguais é injusta e estúpida. Injusta porque usa seus recursos para atender diferentemente aos seus membros; estúpida porque desperdiça o seu potencial, excluindo e desestimulando talentos. A riqueza intelectual da universidade fica prejudicada pela exclusão de talentos não desenvolvidos e pela acomodação diante da falta de concorrência entre todos.
Diferentemente da universidade, que faz parte da democracia das oportunidades desiguais, o futebol é uma atividade de oportunidades iguais. Desde cedo, toda e qualquer criança das cidades brasileiras, desde que alimentada, tem chances iguais de brincar com a bola em campos improvisados. É o mérito, talento e persistência que leva alguns ao topo.
O futebol é o setor das oportunidades iguais, por isso é eficiente (o Brasil tem tantos craques e nenhum Prêmio Nobel), e justo (o Brasil tem tantos craques de origem pobre e tão poucos pobres entre os cientistas).
Não brincando com livros, computadores, sem escolas nem professores valorizados, formados e dedicados, a imensa maioria de nossas crianças fica sem oportunidades, sem possibilidade de desenvolver seu potencial.
Nossos Prêmios Nobel morreram sem saber ler, sem aprender matemática. E sem participar do democrático
campeonato de talento e das oportunidades iguais. A democracia se diferencia da loteria porque esta só pode beneficiar a poucos, nunca a todos, e depende da sorte, não do mérito. A democracia é o regime das oportunidades iguais. E a escola é o ninho onde se constrói a democracia, oferecendo oportunidades iguais a todos.
CRISTOVAM BUARQUE, 66, doutor em economia, é senador pelo PDT-DF. Foi reitor da Universidade de Brasília (1985-1989), governador do Distrito Federal pelo PT (1995-98) e ministro da Educação (2003-04). É autor, entre outras obras, de "A Segunda Abolição" (editora Paz e Terra).

junho 01, 2006

16ª RA: TEREZINHA DA PAULINA MANDA OFÍCIO AO GOVERNADOR LEMBO

Itapeva, 01 de maio de 2006.

Digníssimo Governador.

Referimo-nos ao estudo feito para criação de uma nova Região Administrativa no Sudoeste Paulista, conforme pedido já encaminhado à Vossa Excelência. Visando maior ação do Governo Estadual na região mais pobre do Estado de São Paulo, com o propósito de acelerar o desenvolvimento nos municípios de baixo IDH, o estudo levantou dados que a seguir registramos:

Documento nº 01 – Decreto de nº 20.529, de 10 de fevereiro de 1983 – Governador José Maria Marin: cria a Região Administrativa Especial do Vale do Ribeira, com sede no município de Registro e institui, junto à Secretaria do Interior, uma comissão especial, com a finalidade de promover as medidas necessárias à implantação dessa Região Administrativa Especial.

Documento nº 02 – Decreto de nº 20.770, de 10 de março de 1983 – Governador José Maria Marin: altera o Decreto nº 52.576, de 12/12/1970, acrescendo no parágrafo 1º do artigo 2º, o seguinte item: “Região Administrativa Especial do Vale do Ribeira, com sede em Registro: Barra do Turvo, Cananéia, Eldorado, Iguape, Itariri, Jacupiranga, Juquiá, Miracatu, Pariquera-Açu, Pedro de Toledo, Registro e Sete Barras”, composta por 12 municípios, todos de uma só Região de Governo para acelerar seu desenvolvimento.

Documento nº 03 – Decreto de nº 22.970, de 29 de novembro de 1984 – Governador André Franco Montoro: cria quarenta e duas Regiões de Governo.

Documento nº 04 – Decreto de nº 26.581, de 5 de janeiro de 1987 – Governador Franco Montoro: compatibiliza as Regiões Administrativas com as Regiões de Governo, aparecendo o nome de “Região Administrativa (RA) de Registro” pela primeira vez.

Documento nº 05 - Em 26 de outubro de 1988, através da Lei Estadual nº 6207, de autoria do Governador Orestes Quércia, foi criada a Região Administrativa de Franca, instrumento alternativo de criação de região. Esta RA é composta por 23 municípios: Franca, Patrocínio Paulista, Cristais Paulista, Pedregulho, Rifaina, Jeriquara, Ribeirão Corrente, São João da Bela Vista, Restinga, Itirapuã, Batatais, Ituverava, Miguelópolis, Guará, Buritizal, Aramina, Igarapava, São Joaquim da Barra, Orlândia, Nuporanga, Sales Oliveira, Ipuã e Morro Agudo.

Essa foi a trajetória legal das criações de Regiões Administrativas no Governo do Estado de São Paulo.

Para esclarecer à Vossa Excelência os motivos de nosso pedido, seguem alguns dados da RA de Sorocaba, que abriga a Região de Governo de Itapeva, Avaré, Botucatu, Itapetininga e Sorocaba.

Composta por 79 municípios, a Região Administrativa de Sorocaba vem se caracterizando por uma intensa expansão populacional. Entre 1991 e 2000, apresentou uma taxa de crescimento de 2,3% e o município-sede, de 3,0% ao ano. As maiores taxas, encontram-se em Torre de Pedra e Iperó. Por outro lado, na mesma região, oito municípios (todos próximos à Itapeva) exibiram taxas de crescimento negativas. O município de Itaóca apresentou a mais alta taxa de crescimento anual negativa nesse período, de 1,7% ao ano.

A Regional em Sorocaba não consegue distribuir as ações do Governo de forma justa e eficaz entre as cidades por conta das distâncias e dos diferentes problemas sociais existentes.

Assim sendo, poderia ser usada a estrutura do Estado como instrumento principal de desenvolvimento do maior bolsão de pobreza existente na Unidade da Federação mais rica do país, impedindo o crescimento negativo de municípios dessa região, como vem ocorrendo nos últimos anos. No mapa abaixo, bolsão de pobreza destacado em amarelo.

(NOTA DO BLOG: O MAPA 1 ESTÁ NO FINAL. OS MUNICÍPIOS DESTACADOS EM AMARELO SÃO: Arandu, Sarutaiá, Tejupá, Itaí, Barão de Antonina, Itaporanga, Cel. Macedo, Riversul, Itaberá, Itararé, Buri, Taquarivaí, Capão Bonito, Nova Campina, Ribeirão Branco, Guapiara, Bom Sucesso de Itararé, Barra do Chapéu, Apiaí, Iporanga, Itaóca, Ribeira, Itapirapuã Paulista, Ribeirão Grande).

Como visto no quadro abaixo, do novo conceito de divisão geopolítica, o município de ITAPEVA inserido na CBH – ALPA: Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto Paranapanema(UGRHI 14) estrategicamente, apresenta-se como Pólo de referência para os demais municípios da Região Sudoeste do Estado de São Paulo, por sediar Diretoria Regional de Educação, Coordenadoria da Secretaria da Agricultura - CATI, Divisão Regional da Seccional da Polícia Civil e Universidades, Tribunal da Justiça do Trabalho, Agência do INSS, Corpo de Bombeiros, SEBRAE, Agência da SABESP, Agências Bancárias, Núcleo Regional de Saúde e Hospital Geral de Referência.

À seguir, o mapa baseado na divisão feita pelos comitês de bacia hidrográfica, que separa claramente o lado rico do lado pobre da RA de Sorocaba.

VER MAPA 2 - NO FINAL

O setor público tem papel preponderante de ação na promoção do desenvolvimento regional.

Abaixo, lista dos 27 municípios sugeridos para composição da 16ª região:


Municípios .Área/ Km²...Habitantes...Eleitores
Apiaí........................982........28.163......19.217
B.de Antonina........138...........2.780.........2.359
Barra do Chapéu....404..........4.931.........4.365
Bom S. de Itararé ..135..........3.841.........2.582
Buri ......................1.213........19.387.......12.673
Capão Bonito .......1.619........47.267 ......33.933
Coronel Macedo.....327 .........5.475 .........4.459
Campina M Alegre.173 .........5.871 .........3.886
Fartura ....................482 .......15.435 .......11.633
Guapiara .................412 .......20.715 .......14.307
Itaí .........................1205 .......22.688 .......15.366
Itaóca ......................192 ........ 2.966 .........2.234
Itaberá ..................1.050 ......19.621 .......12.975
Itapeva ..................1.899 ......89.843 .......57.191
Itapirapuã Paulista ..462 ........3.697 .........2.547
Itaporanga ...............508 .......22.094 .......11.790
Itararé ...................1.005 .......47.402 .......33.727
Nova Campina .........385 .........7.295 .........5.911
Paranapanema .........610 .......12.059 .......12.482
Ribeira .....................356 .........3.706 .........2.546
Ribeirão Branco ......697 .......18.539 .......13.277
Ribeirão Grande .....335 .........7.828 .........4.597
Riversul ...................368 .........8.070 ........4.575
Sarutaiá ...................111 .........3.376 ........3.094
Taguaí .....................105 ..........7.433 ........4.897
Taquarivaí ...............233 ..........3.877 ........3.342
Tejupá ......................287 ..........5.350 .......3.819
Total 27 municípios:

15.693 Km²
439.709 habitantes.
303.784 eleitores

28,02 habitantes por quilômetro quadrado


Comparativo das Regiões Administrativas :
Municípios....Nº Mun. Habit.......Hab/Km²
Araçatuba ......43 .......685.000......37
Araraquara ....26........881.000 .....645
Barretos ........19 .......403.000 ......48,7
Bauru ............39 .......984.000 ......61
Campinas ......90 ....5.600.000 .....206
Franca ...........23........662.000 .....63,7
Marília ...........51........910.000 ......49
Pres.Prudente 53 .......800.000 .......9,6
Registro .........14 .......273.000 ......22,5
Ribeirão Preto.25 .....1.100.000 .....117
Santos ..............9......1.500.000 .....645
S.JoséCampos.39......2.000.000 .....126,9
S.J.Rio Preto...96......1.300.000 ......51
São Paulo........39 ....18.000.000 ..2278,6
Sorocaba ........79.......2.700.000 ....64
Itapeva............27.........439.709....28,02

É importante comparar também alguns índices de duas regiões de governo: Botucatu e Itapeva, que pertencem à mesma Região Administrativa de Sorocaba, a qual apresenta relevantes diferenças nos números, como pode ser visto no gráfico abaixo.


(1)Municípios (2) Área / km² (3) População 2005 (4) Nº de eleitores (5)Índice de participação QPM-ICMS 2005 ...(6) Receita Tributária própria 2003 per capita R$ ..(7) ICMS 2003 per capta R$ .. (8) FPM 2003 per capta R$ (9) IDH - RANK ..(10) IDH - 00
(1)............(2)......(3).......(4)......(5)........(6).........(7)........(8).........(9)......(10)
Itapi-
rapuã
Paulista ...462 ...3.697 ..2.547 ..0,009 ..24,83 ..199,52 ..457,93 ..645 ..0,645
Pratânia...179 ...4.145 ..3.262 ..0,013 ..36,27 ..252,16 ..405,9 ....562 ..0,745
Itapeva 1.899 ..89.843 .57.191 .0,143 .68,86 ..135,7 ....93,45 ....558 ..0,745
Botu-
catu .....1496 ..113.711 .78.094 .0,249 .111.91 .161,71 .78,91 .....56 ..0,822
Ribeirão
Branco....697 ...18.539 .13.277 .0,024 ....6,97 ..90,07 ...154,12 ...643 ..0,649
Torre
de Pedra ..69 .....2.424 ..2.308 ..0,006 ...21,86 .214,49 ..694,08 ...409 ..0,768

Na tabela acima, podemos verificar a necessidade de investimentos do Estado numa região onde a receita própria per capita é extremamente pequena e o IDH muito baixo, semelhante ao apresentado por estados do Nordeste:

1º- O menor IDH da Região de Governo de Itapeva, do município de Itapirapuã Paulista, é o pior índice do Estado de São Paulo (0,645).

2º- O menor IDH da Região de Botucatu (0,745) é igual ao maior IDH da Região de Itapeva (0,745).

3º- O menor valor de renda per capita da Região de Governo de Itapeva é o de Ribeirão Branco, com R$ 6,97 da receita própria do município, enquanto que o menor valor de Botucatu é de R$ 21,86, ou seja três vezes e meia a mais do que o daquele.

Oportuno lembrar que as duas Regiões de Governo pertencem à mesma Região Administrativa de Sorocaba, o que prova a desigualdade social existente.

Destacamos também que proposituras diferentes, mas com mesmo objetivo aqui descrito, foram apresentadas na Assembléia Legislativa, onde ainda estão em curso:

Documento nº 06 – Em 2001, Projeto de Lei nº 695, de autoria do Deputado Campos Machado, cria a Região Administrativa de Itapeva. Por ser de autoria de um parlamentar, foi vetado pelo então governador Geraldo Alckmin, cujo veto (documento nº 07) ainda não foi analisado. Em anexo, recorte de jornal local sobre o assunto.

Documento nº 08 – Em 2003, Projeto de Lei nº 06, de autoria do deputado Antonio Salim Curiati, cria a micro-região de Itapeva, que ainda não foi apreciado pela Assembléia.

Documento nº 09 – Em 2005, Moção elaborada pela Câmara de Vereadores de Itapeva foi encaminhada ao Governador Geraldo Alckmin, solicitando a sanção da lei então aprovada na Assembléia.

Documento nº 10 – Em 11 de abril de 2006, Terezinha da Paulina encaminha pedido ao Governador Cláudio Lembo, para criação da 16ª RA para desenvolvimento dos municípios de IDH mais baixo do Estado de São Paulo (anexo jornal local).

Toda nossa região anseia muito por essa medida que é de prerrogativa exclusiva de Vossa Excelência e, conhecedora da sensibilidade social e da justiça que norteia a vida pública de Vossa Excelência, esperamos que dê à região a atenção e o benefício da criação de uma nova RA, já demonstrada, que, certamente, será a redenção do Sudoeste Paulista.

Reiteramos à Vossa Excelência nossos votos de respeito e apreço,

Terezinha de Jesus Morais Vasconcelos Silva

Exmo. Sr.
Dr. Cláudio Lembo
DD. Governador do Estado de São Paulo

(DESÇA PARA VER OS MAPAS 1 E 2

MAPA 1 - RA SOROCABA - BOLSÃO POBREZA EM AMARELO - CLIQUE NO MAPA PARA AUMENTAR TAMANHO

MAPA 2 - que separa claramente o lado rico (VERDE) do lado pobre RA de Sorocaba (clique no mapa para aumentar tamanho)